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ELISÂNGELA E O ÚLTIMO UNICÓRNIO

Numa tarde morna em Realengo ou adjacência,

quando o mundo se aquieta sob o bafo da chaleira,

Elisângela, a Zanza — mulher de sol tatuado e olhar que sabe mais —

subiu pro terraço pra "ver as modas",

mas o que viu... foi o nada.


E no vazio da rua,

entre o grito do sacoleiro e o som longínquo do radinho AM,

ela mergulhou pra dentro,

pra dentro do dentro —

e dali voou.


O quintal virou floresta,

o muro da vizinha, muralha de castelo,

a caixa d’água, torre de princesa.

Seu marido?

Um ogro de bermuda e ciúmes,

que a trancava até nas selfies,

"chega mais pra cá, amor", dizia —

como quem diz:

“não escapa nem na foto.”


Mas eis que, num raio de pensamento dourado,

Zanza avistou o Último Unicórnio.

Solto. Solene. Sem rédeas.

Um ser de aura antiga,

de crina feita de fumaça de incenso e cravo-da-índia,

com chifre dourado apontando para lugares onde GPS nenhum alcança.


Sem pensar, ela se lançou.

Montou o bicho alado —

e ele a levou.

Não por ruas, mas por becos entre as quadras da poesia,

onde a realidade se dobra como roupa no varal

e a alma dança sem avental.


No lombo do licorne,

ela era outra.

Ou melhor, era ela mesma,

mas enfim inteira.

Cabelos soltos, corpo escultural moldado pela lembrança do que desejava ser.

O tempo a desapertava como sutiã no fim do dia.

Zanza zanzava livre.


E sobre o Equador Celeste,

ela se alimentou de nuvens de coco ralado,

sorveu raios de sol na boca,

e sim...

sim, se deixou excitar pelo chifre dourado,

tão erguido e hipnótico,

com um brilho que parecia lamber sua nuca.


Lá em cima, ela visitou zonas erógenas da mente

onde nunca antes havia posto os pés —

um desejo aqui,

um sonho que esqueceu de sonhar ali,

um beijo que só existia no subconsciente,

mas que agora ardia como sol na pele úmida.


Conheceu grifos,

namorou um centauro de olhar doce,

rendeu-se ao carinho de um gnomo poeta

que a chamou de “rainha da laje e do luar”.


Ali ninguém a prendia,

ninguém dizia: “tira essa roupa” ou “posta comigo”.

Ali era só ela.

E a liberdade que pulsava entre suas coxas e seus versos.


Mas então...

o sol — aquele mesmo tatuado nas costas —

refletiu no chifre do unicórnio.

Ofuscada pela luz, Zanza piscou...

e ouviu o barulho do leite fervendo.


Despertou.

Desceu correndo.

Desligou o fogo.

E voltou a ser dona de casa.


Mas com um brilho novo no olhar —

de quem sabe que, mesmo ali, entre feijão e roupa no varal,

há um cavalo alado à espreita,

esperando apenas que ela queira

zanzar de novo.


*DGPT Produções

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