No leito asséptico do posto de saúde,
o destino me deu uma febre incomum:
não era dengue, nem gripe, nem peste,
mas uma 'coisa' que vinha do charme dela.
A dama do postinho, altiva e distante,
de blusão negro e 'saia ancestral',
desenhava no ar sua forma vibrante,
qual deusa asteca num rito carnal.
Eu cheguei e a vi, de costas, sem pressa,
e um calafrio me injetou um delírio,
seu bumbum arrebitado — obra-prima impressa,
tornou-se meu culto, meu sonho, meu círio.
Bumbum talhado por mãos divinas,
arrebatador como um sol equatorial,
cheio de curvas, certezas e rimas,
um altar redentor, um chamado carnal.
A enfermeira chamava, dizia "É só uma picada!",
mas meu sangue já era fervura e vertigem.
A dama esperava, alheia e casada,
enquanto eu tremia num surto de esfinge.
No alto, o mastro da bandeira tremulava,
seu tecido dançava, um convite indecente...
Ah, que vontade de ser seringa encantada
pra injetar-me inteiro em seu corpo febrilmente!
O mundo girava — era a vacina ou a paixão?
E se na agulhada, o amor penetrasse?
Dulcinéia moderna, me fiz Dom Quixote,
ou talvez só um Charlie Brown esperando o enlace.
Mas o tempo é cruel, e o destino, um cético,
a fila andou, e eu fiquei para trás...
Porém, cada dose que agora recebo
me enche de febre, me embriaga de paz.
Pois sei que um dia, quem sabe, num posto,
entre seringas, insumos e filas no chão,
hei de reencontrar a musa anônima,
minha paixão, minha febre, minha injeção.
*DGPT Produções
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