1. O CHEGADO DOS ENCANTADOS
Lá no rastro do sertão,
Por vereda encantadeira,
Veio Zé com sua Catita,
Par de rima e de besteira,
Montados num cavalo
Feito em xilogravura inteira.
Com a viola no gibão
E pandeiro de luar,
Trazem verso que levanta
Até defunto do lugar.
Mas chegando em Chão Trincado,
Viram o povo a penar...
2. O QUADRO DA TRISTEZA
Era terra ressequida,
Com os ossos de animal,
Casa de taipa caída,
Coração em funeral.
Nem fé tinha mais paradeiro,
Nem reza fazia sinal.
Os menino com as costela
Aparecendo no couro,
E o riso da meninada
Sumido feito tesouro.
Nem o tempo tinha tempo
De chorar naquele estouro.
3. O ANÚNCIO DO REPENTE
Zé Cambito se levanta,
Com Catita do seu lado:
— “Se o céu não se derrama,
Pois que seja visitado!”
E no raio do sol quente
Vão pro alto alumiado.
Subiram no tal cavalo,
Que galopa entre os clarões,
Passam nuvem, passam estrela,
Vão rompendo os portões,
Até bater na porteira
Do céu e suas nações.
4. O ENCONTRO COM SÃO PEDRO
São Pedro, com chave em mão,
Vinha indo pra reunião.
— “Zé, Catita, eu tô aperreado,
Com o mundo em confusão!
Lá no Sul chove demais,
Aqui falta oração.”
— “Mas o povo lá de baixo
Já perdeu até a fé!”
— “Pois quem perde essa esperança
Nem mil anjo dá café.
Político ruim fez festa,
E o povo ficou a pé.”
5. A CHAVE DO DESTINO
— “Tô de saída, cangaceiro,
Mas se quiser, fique aí.
Toma essa chave mestre,
Só não bote o céu por fim!”
E sumiu o santo velho
Com pressa de ser serafim.
Catita ficou sem rumo,
Zé coçava a testa quente...
— “E agora, minha estrela,
O que fazemos com a gente?”
— “Vamos fazer forrobodó
Num louvor diferente!”
6. PREPARO DA FESTA NO CÉU
Com a chave na cintura,
Zé desce aos sete rincões,
Vai ao inferno e chama amigo
De antigas rebeliões.
Até volante perdida
Entra em suas missões.
Lá no salão celestial
Junta tudo pra limpar,
Mas não tinha água viva,
Nem pote pra carregar.
Foi quando o cangaceiro
Teve a ideia de estourar...
7. A TORCIDA DA NUVEM
Lassou uma nuvem gorda
Com ajuda dos maldito,
Torceram igual a pano
Com suor e com apito.
Fez-se uma tempestade
Num trovão bonito.
O salão virou enchente,
Mas não parou por ali:
A água caiu no mundo
Bem no canto que sofri.
Chão Trincado virou rio,
Num milagre de florir!
8. O MILAGRE NO SERTÃO
Gado voltou pro terreiro,
As galinha cantaram cedo,
Milho brotou no barro
E o povo perdeu o medo.
Até o sol se escondeu
Pra dar lugar ao arvoredo.
E os político ladrão
Que riam do sofrimento
Foram pegos de surpresa
Com o aguaceiro violento.
Afogados no gabinete,
Viraram só testamento.
9. O TROVÃO DO FORRÓ
Zé tocava a zabumba,
Catita um triangulinho.
E Luiz, do além das notas,
Chegou puxando o carrinho.
Tocaram forró no céu
Que acordou até santinho!
Era festa pra valer,
E os anjo se aboletando,
Até arcanjo dançava
Com asa se arrastando.
Mas São Pedro apareceu
Com o cenho se fechando...
10. O RISO DA ESPERANÇA
Zé e Catita montaram
No cavalo desenhado,
E ao ver a ira do santo
Deram pinote alumiado.
Mas São Pedro, ao ver de cima
O sertão ressuscitado...
...Largou o raio no bolso
E sorriu com emoção:
— “Deixo impune essa doideira
Pois curaram a região.”
E Chão Trincado, chorando,
Virou São Pedro do Sertão.
*DGPT Produções
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