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Mostrando postagens de maio, 2025

ZANZA & BELERO

Lá no sub-bairro entre viela e varal, onde o céu tem mais fio que firmamento, há uma moça que sobe num vendaval todo fim de tarde, sem um lamento — Zanza, a dona de casa que voa no tempo. Belero a espera no terraço, rilhando o casco alado no azulejo gasto. É branco, reluzente, de prumo brando — pégaso vindo, talvez, de algum pasto entre Helicon e os quintais do Encantado. As comadres param o mexido na panela: — Vixi, lá vai ela de novo na asa! — Não é aquela a mulher do Protético, a bela? — Ele deixa, mas disse: “Não passa de casa…” Só que Zanza some no céu feito brasa. Prometeu voar só até a padaria, mas deu voltas ao mundo num trote leve: salta arco-íris, faz curva em nuvem fria, grita “Arroboboi!” pra Oxumarê, tão breve, e volta só depois que o sol já se atreve. Apolo, dizem, mandou-lhe bilhetinho — Hélio piscou da carruagem flamejante. Ela voa entre astros com jeitinho de quem pendura roupa e, num instante, vira dríade em amoreira ofegante. Talhada a malhação, como Salmacis formosa...

ROUPAS HERDADAS 6

 

'PICARDIA POÉTICA'

'Boto na fita' ou só apresento a Carla! E que eu mesmo nem conheci, verdade! E que em comum só a escola e a mesma idade! Sei quem foi não sendo da mesma sala! Tempo que quase não deixou saudade... E por aqui fui sem querer lembrá-la! Saia de pregas, inda a vejo usá-la...! Também me lembro que estudava à tarde! Quase 'casamos' e você nem soube! Eu 'me virei' e não pedi sua mão! Aquela saia... e a imaginar me coube! Por onde andas eu sigo sem noção...! Sei o nome sem querer, ninguém contou-me! Não a conheci e nem vejo desde então!

AH, DONA BEATRIZ DE CIÊNCIAS...!

Ah, Professora Beatriz de Ciência... Jamais soubeste da minha paixão, Eu, que faltava com a obediência, Mas na tua saia rodava a ciência E eu girava em pura combustão. Ah, Professora Beatriz de Ciência... Teu cabelo curto, feito equação, Era a fórmula da minha demência. E teu perfume—ah, que essência!— Me desorganizava o coração. Ah, Professora Beatriz de Ciência... Tanto falavas de reação e calor, E eu só pensava na experiência De ver-te, na pressa, na condução, Colando em corpos no vai e vem do suor. Ah, Professora Beatriz de Ciência... Naquele rush de ônibus lotado, Imaginava o atrito, a iminência, Teu corpo pedindo resistência E eu ali, jamais do teu lado. Ah, Professora Beatriz de Ciência... Tua saia dançava, flutuava no ar, Como a física que eu mal entendia. Mas tua presença era pura magia, Trazia em mim reações de vulcão a jorrar. Ah, Professora Beatriz de Ciência... Eu, aluno relapso, sem vocação, Fiz da paixão minha experiência, Mas Newton, Einstein, Darwin, com sapiência, Jam...

'POEMA DE SÉTIMA SÉRIE'

Fui aluno da Dona Helane... Talvez não o mais aplicado Mas quem se lembra um bocado E ao pensar nunca me engane! 'Dona' apenas por respeito Por ser só um pouco mais velha! Roubou a atenção da matéria! Que eu não aprendia direito Estava no meu ginásio... Era língua portuguesa Mais difícil com certeza! Minha vida no 'prefácio'! Nem militar ou atleta... Mas com certeza feliz Com o que me deu o seu giz...! O seu aluno hoje é poeta!

GI, A RAINHA-INFANTE DOS PORTAIS DE HUXLEY

No espiral dos sonhos meus, onde o tempo se amarra em fitas, o Rinoceronte do Riso II largou seu cetro de brinquedo — por não caber reino em patas tão ternas, nem leis na alma de um ente encantado. Foi brincar noutro quintal de brumas, onde móbiles falam em versos hexassílabos e ex-conselheiros da Corte agora assobiam canções de ninar com segredos do Cosmo. A Babá do Luar, esposa lunar em pranto cósmico, exilou-se em Saturno, colhendo saudade nas argolas como quem fia linho de solidão. No vácuo da abdicação, guardas do baralho tentaram um golpe, mas seus castelos de cartas ruíram ao simples esvoaçar da saia de Dona Helane, hindu e incendiária, que dançava sambas com cheiro de mirra e deboche. Borogodó, em alerta, acordou o Dragão da Sabedoria do seu cochilo em forma de nuvem. Chamou Quixote e pediu: "Treina os gnomos! Ensina as fadas a girar lanças invisíveis com ternura e delírio." As crianças Eloi, de olhos que nunca pestanejam, pegaram em armas que só existem no inventário...

O CULTO DE ABSOLEM

No tempo em que a névoa era verbo e a folha era verso dormindo na flor, Absolem, o Verme do Saber, abandonou o galho e se fez rumor. Virou borboleta — ninguém o viu ir, sumiu do pomar, do narguilé, do luar... E o povo, tonto de tanto existir, sussurrou: "Ziggy o quis devorar." Ziggy, o Camaleão azul de tom único e suspeito olhar, mudava de forma, mas não de cor, e por isso começou a pesar... Na ausência do Mestre do Vento Lilás, subiu-se no topo da tangerineira uma casa de sonhos, de madeiras sacras, erguida por bichos carpinteiros da eira. Cedido o espaço por uma dríade cheirosa, com coxas de murta e hortelã, ali se ergueu o Culto da Bruma, onde a fé flutua e o tempo se desmancha. Sacerdotes — ora druidas, ora sacis — com baforadas em papel de seda, iniciam os crentes no véu lilás O xedô vem das roupas que Vera dava pra Cida. A Coca vem de Vanda, a seiva é secreta, quem bebe levita, delira, sonha. Os humanos, enrolados em lençóis de seda, transfiguram-se: ninfas, sátiros, do...

ITAPERUNA, MEU CANTINHO

No alto tem um Cristo, óia, braço aberto pro sertão — abençoa o povo todo, das barrancas ao sertão. ☀️ Rio Muriaé serpenteia, feito um velho contador: leva história, leva infância, leva sonho e pescador. 🌊 Lá jogava meus hominho na poeira do terreirão, e a guerra de faz-de-conta vinha com o sol do sertão. 🪖 Rosquinha que a gente trazia num saquinho bem fechado — lembrancinha de Itaperuna, com gosto nunca 'alembrado'. 🛍️🧂 Lili me esperava rindo no pastinho sob o arco: tinha um boi que cuspia estrela e um céu pintado de charco. 🌈🐄 A folia vinha chegando, bandeirinha a tremular — e eu menino, feito santo, corria pra abençoar. ✨ Angu fumegava alto, na panela do meu tio: era almoço e era afeto sob o céu de céu anil. 🍲 Queria pegar o trem lá do Ritiro sumido, e com Lili no meu braço, ver o tempo reabrido. 🚂 O barro de tabatinga grudava nos pé no chão — era tinta da memória pintando meu coração. 🏺 Dara, loura da família, hoje dança e faz feitiço: de menina virou riso, de bone...

ZÉ CAMBITO & CATITA ENCONTRAM O FLAGELO DE CHÃO TRINCADO

1. O CHEGADO DOS ENCANTADOS Lá no rastro do sertão, Por vereda encantadeira, Veio Zé com sua Catita, Par de rima e de besteira, Montados num cavalo Feito em xilogravura inteira. Com a viola no gibão E pandeiro de luar, Trazem verso que levanta Até defunto do lugar. Mas chegando em Chão Trincado, Viram o povo a penar... 2. O QUADRO DA TRISTEZA Era terra ressequida, Com os ossos de animal, Casa de taipa caída, Coração em funeral. Nem fé tinha mais paradeiro, Nem reza fazia sinal. Os menino com as costela Aparecendo no couro, E o riso da meninada Sumido feito tesouro. Nem o tempo tinha tempo De chorar naquele estouro. 3. O ANÚNCIO DO REPENTE Zé Cambito se levanta, Com Catita do seu lado: — “Se o céu não se derrama, Pois que seja visitado!” E no raio do sol quente Vão pro alto alumiado. Subiram no tal cavalo, Que galopa entre os clarões, Passam nuvem, passam estrela, Vão rompendo os portões, Até bater na porteira Do céu e suas nações. 4. O ENCONTRO COM SÃO PEDRO São Pedro, com chave em mão...

LILI(QUADRINHAS POPULARES)

   I Lili, no pasto à beira do rio, Com vestidinho de flor, a brisa a cantar, No coque o cabelo negro, brilhando, E a garça a dançar no arco-íris no ar.    II Lili chegou na beira d'água, com a saia no vento, encantada... olhou pro rio, se encostou na palmeira, e o mato ficou sem fala!    III Lili fez o peixe saltar, quando olhou com olhos de luar... só não viu a garça, que se foi voando, porque eu já tava me entregando!     IV Lili sorria, o mato deliciava, a noite se esquentou no olhar... só eu e ela, debaixo da lua, vendo o rio a se enrolar!        III Lili encostou no tronco, com a saia levantada, ai! o rio fez charme com o fundo, e eu morri de vontade, que mais?          IV Ela passou a mão na erva, só pra ver se a flor se espreguiçava... me chamou com um sussurro molhado, e a garça, coitada, já tava falada!            V Lili sorriu com jeito de quem sabe, e o vento nã...